sábado, 25 de outubro de 2008

10.Você não passa de uma mulher

Tem uma música, se não me engano é o Wando quem canta ou por aí, cujo refrão é "você nao passa de uma mulher". Pois é, não queira ser uma super mulher, uma mulher e pronto já está bom. Claro que o ponto de vista do Wando é diferente da meu e falamos de situaçõoes diferentes, mas vamos pegar emprestado por ora. Isto dito...

Depois da biópsia, e antes do início do tratamento, uma amiga me convidou para substituí-la (contratempos) , num Congresso fora do Rio, mas precisamente num Resort na Bahia. Eu fiquei animada, uhuhhh, era tudo que eu precisava, uns dias falando de outro assunto. E o melhor de tudo é que era um encontro de profissinais de outra área, mas nem de longe era chato, pelo contrário, assunto me interessava bastante.

Eram 03 dias num lugar muito legal, com gente que eu nunca tinha visto e nem de longe lembravam meus conhecidos habituais como agentes da cultura, cineastas, produtores, atores e por aí vai. Nada contra, só que eu gostava da idéia de não não estar com meus semelhantes por uns dias, entende?
Eu tinha acabado de fazer a biópsia e estava com o seio cheio de hematomas , maiores do que meu biquini, claro E os meus biquinis são da Ana Amélia, ou seja, para mulheres normais brasileiras.
Estava com a minha porção mulher um pouco, digamos, abalada. O último relacionamento tinha me deixado sequelas nesta área da feminilidade, uma certa insegurança e com a nova realidade de mulher com câncer de mama, vamos combinar, é difícil "vestir uma camisa listrada e sair por aí".

Cheguei e fui direto para o congresso, de homens de camisas listradas e pra dentro da calça com as mangas arregaçadas. As listas variavam, mas em sua grande maioria, todos pareciam ter passado na Richard antes de ir para a Bahia. Mas um grupo variava um pouco e inevitavelmente fui parar na mesa deles, e nesta altura já jantávamos.

Papo vai, papo vem, caipirinha de frutas regionais, éramos 8. Mas um pouco e viramos 6, 2 subiram para o quarto. Que tal tomar um café no bar do hotel, e fumar um cigarro, alguém sugeriu. Ótima idéia, fim do café, éramos 3. Juntamos com outra pessoa que também tomava café e 4 era o número. 4 se divide por 2, e nos encontramos cada um com sua afinidade. Eu me divertia do com R :) (vou chamá-lo assim) que era sócio de uns conhecidos numa empresa e eu nunca o tinha visto (coisa difícil nesta nossa atividade) ou seja, era do mesmo ramo e o papo fluía com facilidade. Mais um café, conhaque e papo vai, papo vem, ficamos os dois. 02 horas se passavam depois do primeiro café, hora de subir, alerta vermelho, terra chamando, alô. Pegadinha ou destino, nossos quartos eram colados umno outro e ainda tinha aquela porta de comunicação entre eles! Rimos da situação e 2 minutos depois estávamos vendo as estrelas, ele tomando um último conhaque e eu comendo chocolate com licor de recheio. Pro beijo foi um pulo. E agora? Naquela situação, só me restava contar, aquilo ia longe. Olha, estou com com curativo, fiz uma biópsia, estou assim, assado, vou começar o tratamento, e pronto, disse, estou com câncer de mama. Ele, ham, ham? E o que é que tem? Qual é o problema de estarmos aqui ? Vamos continuar o papo no café da manhã, mas em vez de bater na porta do teu quarto eu te cutuco, que tal? Era a primeira vez que estava com outro homem depois do pé na bunda e principalmente depois do diagnóstico, tudo era uma novidade pra mim. E não poderia ser melhor, tive sorte. O R :) me lembrou que eu continuava sendo a mesma, que tudo era passageiro, que eu continuava uma mulher sexy e interessante, que esta situação era transitória e que eu não poderia me esconder atrás dela. Foi uma noite muito agradável, com direito a café da manhã no quarto com a porta entre eles aberta, pude lavar o rosto e colocar meus hidratantes e o que é melhor, escovar os dentes com a minha escova!
R:) foi embora naquele dia mais tarde, eu fiquei mais 01 dia e combinamos de nos falar no Rio. Na mesma semana chega um livro na minha casa e um cartão muito carinhoso. O livro: "A Doença como Metáfora", de Susan Sontag, uma execelente leitura e que me ajudou a entender muitas coisas. Desencontros normais da vida que levamos, troca de e-mails e o tempo foi passando. Nos encontramos 02 meses depois, eu já na segunda quimio e ele voltando das inúmeras viajens a trabalho. Foi muito divertido, mas já era outra coisa. Mas pude dizer a R:) o quanto ele tinha me feito bem, o quanto que ele tinha me ajudado naquele momento a me reconhecer a mesma Clélia de sempre dentro daquela nova situação. Fico emocionada só de pensar naquele dia. R:) é um grande homem, um cavalheiro, um príncipe, que me fez sentir uma rainha, e que me ajudou a encarar a situação "sem perder a ternura jamais".
E o R:) tem um lugar reservado no meu coração para todo o sempre.

2 comentários:

Anônimo disse...

Oi Clelia,
Nao sei se conheco vc mas temos coisas em comum: tenho uma otima amiga Zilda (talvez seja ate a mesma) e ha 2 meses fui diagnosticada com cancer de mama.
Foi um puta choque pq a gente acha que nunca acontece com a gente mas, depois de chorar por um mes inteiro esperando a operacao, assumi sua atitude de tenho cancer sim e dai...
Moro sozinha do outro lado do mundo e minha unica familia e um filho de 19 anos que qdo contei ficou um amor comigo mas resolveu se mudar de casa na semana da minha operacao.
Felizmente moro no tal primeiro mundo e apesar de nao ter plano de saude foi tudo de graca, operacao, tratamento,oncologista com direito a enfermeira vindo visitar em casa todo dia, so paguei as consultas do medico de peito e remedios.
Optei por nao fazer quimo e comeco radio em 2-3 semanas, e estou otima.
Andava deprimida antes do diagnostico e agora penso, deprimida porque?
Quem sabe nao te conheco qdo for ao Brasil ano que vem (tive que cancelar minha viagem em dezembro) e a gente celebra o fato de ser sobrevivente guerreira e que nao vai ser um tumorzinho de menos de 2cm que vai me derrubar.
Good luck on your journey bjs

clelia bessa disse...

Oi Miriam, volta pra casa, menina! rsrsrs, brincadeira.
Veja, acho que somos da mesma tribo, apesar da distância imposta por alguma circunstância. Adorei o seu comentário, e com certeza nos conheceremos na sua próxima vinda ao Brasil. Menina, você é forte, heim?
Como vc me achou? Fiquei curiosa.Segue meu e-mail, caso queira um contato mais pessoal. cleliabessa@gmail.com
beijos querida, e obrigada por regar o meu jardim.
clélia