segunda-feira, 23 de novembro de 2009

81. Meu amigo cinqüentão, tudo em cima! Mamografia aos 50 não!


No fim de semana, Renato, meu amigo de longa data, fez uma festa de 50 anos em sua casa na Região Serrana aqui do Rio. Festão. Foi ótimo rever amigos de faculdade, gente que andou conosco nos ano 80, casou nos anos 90 (e deu uma sumidinha) e apareceu com os filhos praticamente adultos, apresentando pra turma e desmentindo fatos ocultos revelados por nós da pessoa paterna. Era um – “Pô pai, caraca, você não me deixa nem ir pra praia sozinha com minhas amigas”!; “Jura?!” e por aí vai. Se eles soubessem o que aprontamos naqueles anos 80.....abafa o caso.

Cinquenta anos. Meio século. Tudo em cima. Os amigos também, perto ou mais de 50, tudo em cima, com algumas exceções já anunciadas lá nos anos 90. Renato já na quinta mulher, dançou a noite inteira sem sair da pista. Fôlego de garoto, feliz da vida. Pois é. Renato se cuida, pratica esportes (até radicais demais pro meu gosto!) e faz exames periódicos. Tem na família um histórico de câncer de próstata, com óbito, e fica atento ao assunto desde os 40. Lembro de se dedicar a insistir com os amigos o exame regular de próstata e todo ano sei que faz o PCa.

Bom, nesta mesma semana comemorativa dos 50 anos do Renato foi amplamente divulgada a notícia que o governo americano “sugere” que a mamografia seja feita após os 50 anos! Como assim?! Segundo os jornais, a junta médica americana fez as “contas” e numericamente é inexpressiva a morte em mulheres com menos de 50 anos!!! Inexpressiva?!! Como assim!! E se dentro desse número inexpressivo esteja a sua mãe, sua mulher e sua sogra? Continua inexpressivo, Dr. Stone, Dra. Bush ou Dr. House???? Ah, claro, só para mulheres sem histórico de câncer na família. Pois bem, euzinha aqui não tinha histórico de câncer na família, até meu pai receber um diagnóstico de câncer de pulmão que estava oculto há muitos anos, chegou depois do meu e levou meu pai em 10 meses. Meu câncer foi detectado aos 45 anos, num exame de rotina de mamografia e eu já tinha 03 tumores! Em 5 anos, para chegar aos 50 que os médicos sugerem, talvez não chegasse, compreende? Quem sabe já teria dado uma morrida? Pois bem, to nem aí para os médicos americanos e continuo minha campanha para a mamografia de 6 em 6 meses em mulheres com mais de 40 anos!!!

Enquanto isso, vou preparando com calma minha chegada rumo aos 50, feliz da vida de ter descoberto meu câncer há tempo de tratá-lo!

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

80. DE GRAÇA, ATÉ MAMOGRAFIA!


Estava eu no meio de uma reunião de trabalho por volta das 14:30 quando um recebo um telefonema de “número particular” no meu celular. Ora, “número particular” no visor é quase um sinônimo de “me atende pelo amor de Deus”, a curiosidade feminina vai às alturas e aposto e du-vi-de-o-dó quem não fica tentada a atender, mesmo porque a gente não tem a menor idéia de quem seja e aí fica melhor ainda!

Bom, atendido o telefone deu-se o seguinte diálogo: “Sra Clélia, por favor, a senhora poderia dar o seu número de CPF e RG para que a gente possa estar emitindo sua passagem para o evento?” Danou-se, pensei , já do lado de fora da minha reunião: telemarketing, pegadinha, sei lá, qualquer coisa do gênero. Que chatice! A moça repete novamente e eu saco outra opção,do tipo sei lá, ganhei algum concurso que eu tinha me inscrito displicentemente num dia qualquer meio entediante. Nada, não lembrava de nenhum. Pois então ela começa a se explicar, já percebendo o meu total desconhecimento daquele telefonema sem pé nem cabeça.

Para encurtar a estória, estavam me convidando, na condição de blogueira, para um evento comemorativo do Outubro Rosa, que aconteceria no dia seguinte em SP. O evento dava ênfase à questão da Lei que dá o direito a qualquer mulher acima dos 40 anos a fazer a mamografia no SUS, de GRAÇA. Estávamos lá, eu e algumas blogueiras do Brasil (não sei quantas, mas umas 40), para “espalhar” esta informação nas redes sociais e principalmente nos nossos blogs. Pois então, vamos lá garotas, avante!

Mas vou além uma vez que você que está lendo este meu cantinho provavelmente deve ter plano de saúde, certo? E se já chegou até aqui deve ter acesso à informação e já está careca (ops!) de saber desta lei. Então minha amiga, tenho uma proposta: avise a moça do supermercado que já sabe tudo que você come na semana, a trocadora (cobradora) do ônibus que você usa com regularidade, a atendente da lanchonete onde você toma aquele cafezinho bem gostoso, a moça da faxinha do prédio do seu escritório que ouve você falar no telefone e deve saber de cor o nome de toda a sua família, a ascensorista do prédio dos seus inúmeros médicos que já viu você sair rindo, chorando, comemorando, pensativa, enfim, mulheres que estão na sua vida quase todo dia mas que por algum motivo você não vê. Avise a elas, explique como funciona, tenho certeza que a partir deste momento ela não será mais invisível. E nós todas estaremos espalhando esta notícia aos quatro ventos!

PS> Fui lá, foi bacana e conheci a Luanda Barros, blogueira pernambucana e uma graça de pessoa.

sábado, 3 de outubro de 2009

79. Positiva e Operante!


Hoje faz um mês que meu pai faleceu depois de lutar contra um câncer de pulmão. Saudades.
Nos últimos meses fiquei muito envolvida com esta situação e neste último resolvi me recolher um pouco e tirar férias do blog. Com a doença do meu pai adiei minha cirurgia de reconstrução, fiquei com medo de sair do foco do blog e não voltar nunca mais!
Well, como nada se perde, tudo se transforma, então ta bom: retorno nos médicos já nesta semana, exames, e motivos de sobra pra voltar a escrever neste meu puxadinho. Vou começar a escolher modelos para os meus seios novos (é, pq o outro que ficou precisa ser repaginado!), inventar novos cortes de cabelo agora que eles já estão “encorpados” e me preparar para o Rio 2016! Não quero perder por nada esta festa aqui no Rio! Não quero perder por nada o espírito regenerador que se apossou de mim desde o meu diagnóstico, a alegria de viver e principalemente rir de mim mesma.
Quanto ao meu pai, sei que não vou mais bater um papo, receber uma piada por email, ouvir um “fala baixinha” no telefone antes de dar bom dia ou tirar qualquer dúvida sobre qualquer coisa, já que ele era o meu Google particular, entre outras delícias. Mas tenho certeza absoluta que ele diria: “ta bom baixinha, já fui mesmo, vai cuidar da sua vida”! Fui.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

HOMENAGEM AO SEU BESSA NO DIÁRIO DO AMAZONAS


O NETO DA VOVÓ

De onde é que tio Eduardo tirou aquele nome? Ninguém sabe. Mas da Bíblia, que ele lia diariamente, não foi. Não existe, nem no Antigo nem no Novo Testamento, profeta, apóstolo, evangelista ou santo chamado Heyrton. Foi, porém, com esse nome raro – Heyrton - que batizou o filho, pimbudo e ligeiramente estrábico, nascido em 1937, num seringal em Sena Madureira (Acre). O primogênito encabeçou uma lista de quarenta netos da vovó Marelisa, reinando durante algum tempo, soberano, como primeiro e único, até o nascimento dos demais.

Quase todo mundo tem apelido. Mas, engraçado, o Heyrton não! É fácil explicar. Um dos irmãos dele, por exemplo, reconhecido internacionalmente pelo nome artístico de Djwery Power, seria um ilustre desconhecido, se fosse apenas um Geraldo qualquer. Isso porque, em toda família que se preza, há sempre um Geraldo. Djwery Power, porém, só tem um. Aqui, o apelido é que confere a singularidade, a notoriedade.

Não é o caso do Heyrton, que carece de apelido, posto que só três seres no planeta – e olhe lá! - giram a cabeça, quando escutam esse nome: os dois Heyrton, pai e filho, e um cachorro de raça, na Bélgica que, por sua fidelidade e beleza, deu origem ao “Troféu Heyrton da Planície de Flandres”, se o Google não mente.

Na boléia

Aos quatro anos, sem ter freqüentado escola, Heyrton olhou uma placa e soletrou em voz alta: E-pa-mi-non-das, nome da avenida que corta a rua Monsenhor Coutinho, no centro de Manaus, onde vovó morava, num casarão com porão e jardim. Assombrou a família. Passou a ser atração dos vizinhos, lendo manchetes do Jornal do Commércio, como a notícia do bombardeio de Pearl Harbor pelos japoneses, em dezembro de 1941.

Foi assim que os netos cresceram, ouvindo essas e outras façanhas, enriquecidas ao longo do tempo com novos detalhes, recriados nas reuniões familiares, que eram muitas, naquela Manaus dos anos 1950, onde as famílias viviam tribalmente. A casa da vovó era uma grande maloca, com cheiro de tabaco do cachimbo, que ela pitava, e de café, que ela pessoalmente pilava. Ora tibis! Como era bom o cheiro da vovó!

Maloca aglutinadora. Ela unia e reunia a tribo. Nas noites quentes de Manaus, enquanto os adultos discutiam a empresa de ônibus estatal Transportamazon, criada pelo PTB local, os netos de todas as idades se aboletavam na carroceria de uma fubica do tio Manoel, dirigida pelo Heyrton, já com 18 anos, olhado por todos com reverência e admiração. A fubica descia a João Coelho e subia o boulevard até a Caixa D´Água, no meio de muita algazarra. Era uma senhora aventura! O lugar dele, na boléia, nunca foi questionado.

Logo depois, Heyrton encontrou Rosilene, paixão fulminante, com quem casou, levando a sério o “até-que-a-morte-nos-separe”. Quando o genro predileto, anos mais tarde, lhe prestou homenagem, batizando suas próprias úlceras – eram duas - com os nomes de Rose, uma, e de Lene, a outra, o sogro fez um comentário matemático: “É. Ela vale mesmo por duas”.

Graduado em química, Heyrton fez a pós-graduação em física, na Universidade Federal do Paraná, onde nasceu a primeira filha. De regresso a Manaus, trabalhou como pesquisador do INPA e de lá saiu, concursado, para lecionar física na Universidade Federal do Amazonas e na Escola Técnica Federal de Manaus. Suas aulas inesquecíveis lhe renderam homenagem dos alunos, que batizaram, com o nome dele, o Laboratório de Iniciação Científica.

Era seresteiro. Tocava violão e piano. Foi a primeira pessoa que ouvi cantar em espanhol: “Malagueeeeeeeña, salerosa”. Depois, a partir dos anos 1970, as noitadas de dominó e as conversas regadas à cervejinha, que ele tanto apreciava, foram tecendo relações sólidas de afeto e cumplicidade. Deixamos de ser primos. Passamos a ser irmãos, compartilhando reflexões, entre outras, sobre a educação dos filhos.

Defendeu com pensamentos, palavras e obras o direito de cada um decidir sobre sua própria vida, sobretudo seus filhos, cuja liberdade de escolha foi sempre por ele estimulada. Era um compromisso radical, que os meninos souberam apreciar e valorizar. Mas não abdicava do seu lugar na boléia: - “Baixinha, vamos combinar assim: você cuida do teu câncer, que eu cuido do meu” – ele disse pra filha mais velha, com câncer de mama, que tentava, no desespero, encaminhar o tratamento do pai.

Estou indo

No início dos anos 1990 – ele já aposentado – nossas famílias mudaram para Niterói, de onde essa coluna passou a ser remetida semanalmente até os dias de hoje. Ele dizia que era um caso singular, alguém ter que andar quase dois quilômetros - a distância entre nossas casas - para se comunicar via internet. É que, analfabeto digital, eu lhe levava um disquete com a crônica semanal. Ele me hospedava na sua home-page – Cidade Virtual dos Bessa e Birutério – e era de lá que repassávamos o artigo.

A coluna, antes de ser enviada ao jornal, era lida por ele, a quem eu solicitava críticas, argumentando: - “É para o controle de qualidade”. Suas observações, quase sempre incorporadas, me davam segurança. Heyrton tinha um raciocínio lógico, científico, rigoroso, que usava para olhar o mundo, os fatos, o cotidiano, com a precisão de um cirurgião ou de um relojoeiro, mas com um humor discreto, elegante, comedido, refinado. Era enxuto, não apreciava a verborragia nem a retórica ribombante.

Um dia, em julho de 1995, a coluna fez gozação com o prefeito de Manaus. Aí, um vereador puxa-saco, que sequer havia sido mencionado, subiu à tribuna e esculhambou o Taquiprati, só pra mostrar serviço. O troco veio na semana seguinte, procurando, porém, poupar a irmã do bajulador, uma figura doce, que merecia explicações. A sugestão do Heyrton foi substituir um parágrafo de quinze linhas por um recado fulminante que dizia tudo: “Peço desculpas, mas teu irmão atirou primeiro”.

Seu humor funcionava como uma fisgada sutil, ágil, de onde aflorava a verve popular. Os quatro testamentos do Judas, publicados em versos, em anos diferentes, foram redigidos por ele. No ano passado, Judas não poupou nem o Eduardo Braga: “E pro povo do Amazonas / governado pelo Dudu / deixo apenas a esperança / de não mais tomar na rima”. No testamento de 1987, Judas contemplou o então vice-governador: “Vivaldo Frota a ti deixo / neste claro mês de abril / pra curar tuas hemorróidas / tubinhos de Cola Mil”.

Cada ano, a família comemorava o aniversário de nós dois, com uma única festa, celebrada no mesmo dia. O último foi há menos de dois meses, quando somando as idades, completamos 134 anos. Sopramos as velinhas correspondentes que enfeitavam o bolo, onde aparecia impressa a foto da vovó cercada dos netos. De lá para cá, seu estado de saúde se agravou celeremente, o que podia ser constatado em cada visita.

Domingo passado, falamos sobre a morte. Quem puxou a conversa foi ele, quando perguntei: - “E aí?”. Respondeu sereno, digno, quase altivo: - “Estou indo. Contrariado, mas sem medo”. Enquanto o neto da vovó se ia, lembrei o poeta Vallejo: “Tanto amor y no poder nada contra la muerte”.

Se você entrar agorinha no blog e clicar em “Perfil do Heyrton”, vai ler essa frase: “Heyrton não fez nada de novo recentemente”. Não é mais verdade. Fez sim. Nessa quinta-feira, dia 3 de setembro, às 13:30hs, ele foi embora, em paz, segurando a mão do filho e da filha, cercado do carinho da família, em casa, como queria, mantendo a lucidez até o final.

Teve uma única mulher, três filhos e seis netos, mas deixou muitas viúvas e dezenas de órfãos. Sou um deles. No próximo ano, completo, na maior solidão, apenas 63 anos, com a dor dos 73 que se foram. Rose perdeu seu companheiro de meio século. Dodora, seu mano de toda a vida. Os filhos, o pai exemplar. Todos nós perdemos o patriarca, o primo, o irmão, o tio, o avô, o conselheiro, o parceirinho querido de tantos dominós, porém ficou sua referência ética. O leitor da coluna também perde seu “controle de qualidade”, a rima e a veia poética desse cavalheiro de fina estampa. Ele se foi, levando com ele o cheiro da vovó.

José Ribamar Bessa Freire -06/09/2009

sábado, 5 de setembro de 2009

LUTO


Infelizmente meu pai não resistiu a um devastador câncer de pulmão e faleceu no dia 03 de setembro, às 14hs de um dia solar de primavera na cidade de Nitéroi, RJ. Morreu em casa, com os filhos segurando sua mão e com a certeza de que sua vida tinha valido a pena. Já sinto muitas saudades, mas o seu Bessa até nisso foi maravilhoso: nos preparou com antecedência para este momento com o humor e carinho de sempre, e quando a doença fugiu ao controle saiu de fininho. Sempre elegante o meu pai.
Tive a sorte de ter sido sua filha, dele ter me indicado sempre as direções certas e sempre me apoiado nas minhas escolhas nem sempre as mais certeiras.
Meu amor, muito obrigada por me deixar tão boas lembranças.
Te amo pra sempre.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

78. SEU BESSA, GUENTA FIRME!


Neste mês de julho e agosto estive fortemente comprometida com o trabalho que estava muito intenso. Normal, e eu gosto. Mas o fato é que além do trabalho, acabei me fechando em copas....

O câncer, como já falei em post anterior, resolveu brincar na minha seara, e meu pai desde dezembro tem enfrentado todo tipo de desconforto por conta do câncer de pulmão descoberto já em estado avançado. Em Dezembro descobrimos uma metástase, o que nos deixou atônitos e tristes, claro, afinal a nossa conta já estava preenchida! Que nada, um passinho à frente, por favor, e no mesmo dia que fazia minha mastectomia meu pai enfrentava a primeira quimioterapia . Só aqui dá rima, no mais é puro mal estar.

Certamente está sendo muito mais difícil lidar com o câncer do meu pai do que com o meu. O meu tinha controle, o do meu pai não mais. Já não tem mais cura, e agora pensamos simplesmente em lhe dar conforto, amor e dignidade.

Sou a filha mais velha, e de longe meu pai é o homem que eu mais amei ou amo em toda a minha vida. E olha que eu já tive muitos amores e conheci muita gente bacana no meio do caminho, mas meu pai é fora de série. Excelente pai, grande amigo, bem humorado, muito inteligente, papo agradável, sempre uma presença valiosa e discreta em nossas vidas. Precioso. Tenho estado com ele o máximo de tempo que eu posso, acompanho minha mãe onde dá, viro mãe e filha em minutos. O que tenho feito com ele? Lendo histórias e o jornal, vendo jogos do Botafogo na TV . Coitado do meu pai, além de câncer é torcedor do Botafogo, como eu...E claro, fico fazendo cafuné, contando piada, exagerando nas cores, levando o máximo de vida que eu posso para dentro do seu quarto.

E agindo, como já nos ensinou Paulinho da Viola: ...“Faça como o velho marinheiro, que durante o nevoeiro, leva o barco devagar”.

Aguenta firme papai, estamos juntos nesse barco.